Pandemia agrava situação do teatro na região
Com falta de espaços e agenda em tempos normais, companhias dependem quase exclusivamente de subsídios estatais para manter atividades
Douglas Mota

Apesar de vizinhas ao Rio de Janeiro, tida como a capital cultural do Brasil, as cidades da Baixada Fluminense carecem de políticas públicas que incentivem a cultura. Se normalmente esse cenário já era hostil aos trabalhadores da área, com a pandemia de Covid-19, que provocou o fechamento dos espaços, houve um impacto sem precedentes a todos. Um dos segmentos mais afetados, o teatro precisou migrar para a internet para não sucumbir, mas a remuneração ainda fica aquém das bilheterias, sem previsão de reabertura.
A Cia de Teatro Uz Outrus, fundada há 10 anos em Nova Iguaçu, é um dos grupos que tentam driblar com criatividade a distância do público. “Tínhamos três peças programadas para estrear, inclusive planejávamos apresentar uma temporada de ‘Morre uma estrela’ no Rio e mais apresentações na Baixada e na Região Serrana”, conta o diretor geral da companhia, Gabriel Fontoura.
Assim surgiu o projeto “Quarencena”, nome nascido de um erro de digitação do produtor Gabriel Ribeiro. A primeira tentativa foi uma leitura dramatizada ao vivo no Instagram da peça “Esperando Godot”, do irlandês Samuel Beckett, em março. Em seguida, migraram para os podcasts e produziram cinco espetáculos em áudio baseados em textos de outros autores. Também realizaram a quarta edição do Show de Talentos, festival competitivo de musicistas amadores, que foi realizado à distância e transmitido no YouTube.
Apesar do volume de conteúdo produzido para a internet, a Cia Uz Outrus ainda não cumpre os requisitos das plataformas de streaming para monetizar suas obras. Uma oportunidade, porém, surgiu com o edital Cultura Presente nas Redes, do governo do estado, que concedeu R$ 2,5 mil para produzirem dois episódios originais de “Pedro III”, sátira política que imagina um Brasil quebrado pelos efeitos da pandemia que volta a ser uma monarquia. Com a verba, foi possível pagar os cachês dos artistas, adquirir equipamentos e contratar um compositor para elaborar uma trilha sonora original.
Esta segunda temporada ainda deve ter mais quatro podcasts dramáticos originais: “Até então, nada” (publicado em outubro), “BesteirOz”, “Um conto de natal” e “Sigam-me os bons – A trajetória de Chespirito”, que devem ser produzidos até o fim do ano, mas sem a ajuda financeira. Para 2021, eles contam com um edital da prefeitura de Nova Iguaçu para gravarem uma terceira temporada, em formato de série, baseada nas histórias do detetive Sherlock Holmes. Também planejam realizar o festival de esquetes “Monologuz e personagenz” e o documentário “Teatro iguaçuano – a estrada até aqui”.
A volta aos palcos depende da aprovação de uma vacina para a Covid-19 e da imunização em massa, mas também de políticas públicas a serem adotadas pelos novos prefeitos, uma queixa comum aos agentes culturais da Baixada Fluminense. Faltam espaços e, nos poucos disponíveis, a burocracia e a falta de agenda disponível é um empecilho, principalmente para as companhias de teatro.
Tomando o exemplo de Nova Iguaçu, Gabriel Fontoura relata as dificuldades que encontra ao tentar ocupar os palcos da cidade. “O teatro do Sesc é o melhor, mas só atende os projetos próprios. Suas burocracias impedem que grupos locais não-profissionalizados submetam projetos”, conta. O Teatro Sylvio Monteiro, na Casa de Cultura, é o único público. Com 140 lugares, costuma ser ocupado por outras atividades, como eventos de órgãos públicos, formaturas e aulas, sobrando poucos dias para a programação cultural – problema comum a vários municípios e que serão de responsabilidade dos 13 novos prefeitos que assumirão no dia primeiro de janeiro.
Índice – Edição V
2. Poesia: “Fotografia da exclusão”, de Ivone Landim
3. Reportagem: Mais de 2 milhões de pessoas não têm coleta de esgoto na Baixada
4. Reportagem: Paraíso verde no Recôncavo da Guanabara – uma viagem a Guapimirim
5. Poesia: “O beijo e o bicho”, de Marcio Ruffino
6. Reportagem: Pandemia agrava situação do teatro na região
7. Galeria: Marcos Maciel – fotografia
8. Artigo: Se a cidade fosse minha
9. Trecho retirado do livro “Parnaso Brasileiro” (1843), de João Manuel Pereira da Silva
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